SANTA CATARINA VAI ENDURECER FISCALIZAÇÃO CONTRA O USO DE AGROTÓXICO

Entre os assuntos debatidos durante a reunião, seis propostas para aumentar a fiscalização do uso de agrotóxicos na produção de alimentos já estão em fase de implementação

farmer spraying pesticide in the rice field

Pelo menos seis propostas para reduzir os impactos dos agrotóxicos na produção de hortaliças e tornar os alimentos mais seguros foram extraídas do encontro realizado em Santo Amaro da Imperatriz, no dia 14 de agosto, com mais de 120 participantes de diversos municípios. A reunião tratou da fiscalização de agrotóxicos e produção segura.

O encontro foi realizado a convite do Centro de Apoio Operacional do Consumidor (CCO) do Ministério Público de Santa Catarina, da Associação dos Municípios da Grande Florianópolis, da Federação Catarinense de Municípios (FECAM) e da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (FETAESC), com apoio da Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola (CIDASC), Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural (EPAGRI), Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA) e Centro de Informações Toxicológicas (CIT).

Os pontos em destaque, relacionados abaixo, encontram-se em diferentes fases de implementação, sendo que alguns já estão consolidados e outros ainda dependem da confirmação pelas organizações:

Análises de resíduos de agrotóxicos e ativos veterinários devem atingir mil amostras por ano

A Promotora de Justiça Greicia Malheiros da Rosa Souza, Coordenadora do Centro de Apoio Operacional do Consumidor (CCO), do Ministério Público do Estado de Santa Catarina (MPSC), anunciou, em Santo Amaro da Imperatriz, a aprovação de projeto apreciado pelo Fundo para a Reconstituição de Bens Lesados (FRBL), o qual permitirá, em 2018, a expansão das análises laboratoriais de resíduos de agrotóxicos a produtos de origem animal e derivados e na água tratada, abrangendo assim as atividades relacionadas a programas do MPSC na área animal (POA) e na água.

Estima-se em mil análises de monitoramento por ano o total a ser atingido. De 2010 a 2017, as análises no âmbito do Programa Alimento Sem Risco (PASR) foram direcionadas a hortaliças, frutas e grãos. Em 2018, além dos agrotóxicos, serão pesquisados ativos veterinários nos produtos de origem animal e derivados, de modo a verificar, no plano estadual, a conformidade legal de antimicrobianos, anticoccidianos, antiparasitários e anti-inflamatórios usados em animais. O projeto também tem a cooperação da CIDASC e do Ministério da Agricultura (MAPA).

De acordo com a Promotora de Justiça, de 2010 até junho de 2017 o CCO já verificou, em parceria com a CIDASC e Vigilância Sanitária Estadual, perto de 2.500 análises de resíduos de agrotóxicos em produtos de origem vegetal, no âmbito do PASR. Como resultado, o percentual de produtos vegetais fora da conformidade caiu de 34,5% do total para 18,2%. Os dados das análises indicam, contudo, que há espaço para redução mais significativa desse índice se o conjunto de medidas adotadas pelas Promotorias de Justiça, com o apoio da CIDASC, da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural (EPAGRI), do Ministério da Agricultura (MAPA), da Centrais de Abastecimentos (CEASA), da Vigilância Sanitária e das entidades que representam os agricultores, como a FETAESC, e os varejistas, como a Associação Catarinense de Supermercados (ACATS), for absorvido e implementado com maior celeridade no meio rural.

Na opinião do médico Pablo Moritz, do Centro de Informações Toxicológicas (CIT), se todo o uso de agrotóxicos fosse interrompido imediatamente as gerações atuais e as próximas continuarão a sentir seus efeitos na forma das mais diversas doenças como depressão, má formações congênitas, alguns tipos de câncer, transtornos da imunidade e alterações na reprodução humana. O relato, amparado em pesquisas científicas, demonstrou que as práticas de uso intensivo de produtos químicos no campo estão lentamente acabando com a saúde dos agricultores e de todos os consumidores de produtos de origem vegetal e animal, muitas vezes sem a percepção dos riscos associados, além dos efeitos diretos no meio ambiente e na contaminação das águas e do solo.

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Registraram-se nas Promotorias de Justiça com atuação na área do Consumidor, até 2016, mais de 300 acordos extrajudiciais firmados por agricultores, comerciantes de agrotóxicos, distribuidores, supermercadistas e outros atores do comércio de alimentos vegetais, para promover medidas há muito tempo reguladas como boas práticas agrícolas, uso somente de agrotóxicos registrados e vinculado a receituário agronômico emitido por profissional que tenha visitado a lavoura, identificação da origem do alimento, orientação e proteção aos próprios agricultores que aplicam insumos tóxicos com elevados custos e prejuízos muitas vezes irremediáveis à saúde humana e ao meio ambiente.

O número de acordos extrajudiciais traduz o esforço das organizações públicas para defender o direito do consumidor a alimentos mais seguros. A respeito do programa, a Coordenadora do CCO expôs aos agricultores e demais profissionais reunidos em Santo Amaro da Imperatriz as principais linhas de ação do PASR, que já foi premiado pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Greicia destacou, como ponto chave, a cooperação entre os órgãos e a expansão do monitoramento de resíduos de agrotóxicos em vegetais, hoje difundida no Estado com 620 análises/ano, em parceria com a CIDASC, como instrumento para promover a adequação dos cultivos às exigências legais.

Identificação da origem do produto agrícola poderá ser gerada sem ônus ao agricultor

O agricultor catarinense poderá gerar o código de identificação da origem do produto vegetal, sem ônus, por meio de módulo desenvolvido pela Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina (CIDASC) que se encontra em fase final de testes. O módulo integra o sistema SIGEN+ e está previsto na Portaria Conjunta SES/SAR n. 459/2016, que trata da rastreabilidade como uma das medidas para auxiliar o agricultor a informar ao fornecedor e ao consumidor a origem do alimento colocado no mercado de consumo. Santa Catarina tem cerca de 170 mil estabelecimentos agropecuários, em sua maioria composta de agricultores familiares.

A apresentação do sistema foi conduzida pelos Engenheiros Agrônomos Alexandre Mees, da Divisão de Defesa vegetal, e Matheus Fraga, da Divisão de Fiscalização de Insumos Agrícolas da CIDASC, no dia 14 de agosto, em Santo Amaro da Imperatriz, para mais de 120 agricultores, comerciantes e gestores públicos. Fraga informou que as Secretarias de Estado da Agricultura e da Saúde, órgãos responsáveis pela edição da norma com a colaboração da Vigilância Sanitária e da EPAGRI, decidiram prorrogar o início da vigência para agosto de 2018, de modo a permitir a melhor divulgação do sistema entre os agricultores e ajustar eventual erro antes de colocá-lo em operação.

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Além da identificação da origem do hortícola, que é um dos requisitos exigidos pelo MPSC nos acordos extrajudiciais, o sistema também oferece ao agricultor a possibilidade de registrar em caderno de campo todos os dados relevantes do uso de insumos no cultivo. A EPAGRI e a CIDASC desenvolveram conjuntamente o formulário. A Portaria tem amparo de várias normas federais e estaduais, algumas delas publicadas há mais de 50 anos, e objetiva disseminar a rastreabilidade dos alimentos in natura ou minimamente processados em todas as etapas de sua produção, manipulação, beneficiamento e comercialização, tanto daqueles originados em Santa Catarina quanto vindos de outros Estados ou importados do exterior. A norma vale para todos, mas o sistema tem a finalidade de facilitar o cumprimento da regra pelos agricultores catarinenses no preenchimento do cadastro de produtor primário, de caráter declaratório.

Alexandre Mees explicou que as empresas, geralmente supermercados e distribuidores que já possuem rastreabilidade implantada, poderão se integrar ao sistema da CIDASC por meio de webservices (troca automatizada de dados). Segundo ele, a ideia é simplificar toda operação. A questão central agora é sensibilizar os agricultores e construir uma rede de facilitadores entre as organizações para que o cadastro inicial e os registros dos produtos cultivados sejam lançados e passem a ser usados de forma contínua.

No que diz respeito ao comércio de agrotóxicos e emissão de receituário agronômico, o Engenheiro Agrônomo Felipe Penter explicou o papel exercido pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA/SC) na verificação das responsabilidades técnicas atinentes e informou que a autarquia pretende aperfeiçoar a identificação de eventuais desvios entre os profissionais habilitados para coibir abusos e distorções.

Boas práticas agrícolas e novas tecnologias de cultivo difundidas pela EPAGRI

O encontro em Santo Amaro da Imperatriz ocorreu a pedido de Sindicatos dos Trabalhadores Rurais da região, formulado inicialmente à CIDASC e ao Centro de Apoio Operacional do Consumidor (CCO), em razão da preocupação dos agricultores em encontrar soluções que os ajudem a migrar para novas tecnologias de cultivo, tendo a adequada orientação para proceder corretamente no cumprimento aos requisitos sanitários.

A respeito da produção segura, coube ao Engenheiro Agrônomo Paulo Francisco da Silva, coordenador do Programa de Olericultura, relatar as tecnologias difundidas pela Empresa de Pesquisa e Extensão Agropecuária (EPAGRI) que estão alinhadas a práticas agrícolas que reduzem o uso de insumos em até 50%, com algumas técnicas já comprovadas, agregam qualidade ao solo e ao alimento, gerando benefícios aos agricultores e ao meio ambiente, como os Sistemas de Plantio Direto de Hortaliças, Cultivo Protegido e Produção Integrada.

No sistema de plantio direto, por exemplo, muitos são os benefícios para a saúde do solo, das plantas e de quem produz, tendo como princípios básicos o revolvimento da terra somente na cova ou sulco de plantio, a diversificação na produção pela rotação de culturas, o manejo de pragas, a redução de custos com o uso de produtos químicos, o aumento na renda e, principalmente, da qualidade de vida dos agricultores. Trata-se de ferramenta para melhorar a produção das principais hortaliças cultivadas em Santa Catarina, a partir da racionalização dos fatores de produção. Busca melhoria na renda e redução nos impactos ambientais negativos, especialmente quanto à contaminação dos alimentos, dos recursos naturais e a degradação do solo.

Na direção à sustentabilidade agrícola, o professor Valério Turnes, da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), relatou sua experiência na orientação de organizações de produção sustentável e chamou a atenção dos agricultores para as mudanças que se verificam a cada momento no mercado consumidor, com maior destaque às novas exigências e regulações, as quais, de uma maneira ou de outra, acabarão sendo atendidas por fornecedores de outras regiões se a produção catarinense não comportar o atendimento dessas demandas. Segundo ele, é fato que os grandes produtores já enxergam a produção segura como um espaço para prosperar se a agricultura familiar não se organizar e começar a agir com maior cooperação.

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Projeto objetiva desenvolver assistência técnica a agricultores familiares

Na busca de caminhos para que os agricultores da Grande Florianópolis possam melhorar os resultados das suas atividades, bem como atender as exigências de produção segura, o Coordenador da Câmara Especializada de Agronomia do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA-SC), Engenheiro Agrônomo Jorge Dotti Cesa apresentou uma proposta inicial de parceria para que os pequenos agricultores tenham maior facilidade de acesso a uma efetiva assistência técnica individualizada na propriedade.

Na sua opinião, o agricultor tem que assumir suas responsabilidades frente aos avanços e exigências nas áreas tecnológicas, sociais e ambientais, mas é dever do poder público e entidades do setor dar o devido apoio. “A assistência técnica junto com a extensão rural são a base de informação e orientação para que os agricultores possam evoluir e produzir alimentos de forma rentável e com segurança para sua própria família e para os demais consumidores”, destacou o Coordenador do CREA-SC. Para ele, o receituário agronômico é uma ferramenta indispensável no controle e uso adequado de agrotóxicos, mas a sustentabilidade da atividade agrícola e da própria segurança alimentar vão muito além do receituário. Exigem uma assistência técnica individualizada e permanente.

A ideia seria inicialmente implantar projeto piloto em um ou dois municípios da região, com a colaboração da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (FETAESC) por intermédio do sindicato afiliado e apoio da EPAGRI, para organizar e motivar grupos de agricultores em torno da parceria. Formado os grupos, a EPAGRI fará a capacitação em tecnologias mais sustentáveis, com redução ou até eliminação do uso de agrotóxicos, sugerindo a transição para processos produtivos mais rentáveis e seguros.