Virar uma página pode ser apenas um gesto simples ou o início de uma nova história. Na cidade de Três Barras esse movimento ganhou significado concreto com o projeto “Virando a Página”, desenvolvido pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), com apoio do Poder Judiciário de Santa Catarina (PJSC). A iniciativa transforma a leitura em instrumento de mudança para adolescentes que cumprem medidas socioeducativas em meio aberto.
Mais do que incentivar o hábito de ler, o projeto propõe a literatura como um espaço vivo de diálogo, escuta qualificada e reflexão. Cada obra lida se torna uma oportunidade para que os jovens revisitem suas próprias histórias, ampliem perspectivas e construam novos caminhos, em consonância com o caráter educativo previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e na Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase).
Medida socioeducativa com sentido restaurativo
Para o juiz Lucas Chicoli Nunes Rosa, titular da Vara da Família, Infância e Juventude da comarca de Canoinhas, o “Virando a Página” fortalece o sentido educativo e restaurativo das medidas em meio aberto ao transformar a leitura em uma experiência concreta de aprendizado e responsabilização.
“O projeto valoriza o protagonismo do adolescente e oferece uma chance real de ressignificar trajetórias, com acompanhamento técnico e critérios objetivos. Quando a medida deixa de ser apenas um cumprimento formal e se torna um caminho de construção de projeto de vida, o adolescente passa a ser reconhecido como sujeito em desenvolvimento”, destaca o magistrado.
Metodologia estruturada e acompanhamento técnico
Coordenado pelo psicólogo Jeferson Ostroski Martins, o projeto teve início em junho deste ano e conta com uma equipe técnica multidisciplinar, formada por assistente social, advogado e colaboradores das áreas de Direito, Filosofia e Ciências Humanas.
O público atendido é composto por adolescentes de 12 a 18 anos, autores de ato infracional, que passam a ter contato com a proposta já na elaboração do Plano Individual de Atendimento (PIA).
“A metodologia prevê encontros semanais no CREAS, com rodas de conversa, mediação de leitura, dinâmicas e produção de resenhas críticas. Os jovens escolhem livros que dialoguem com suas vivências, e o acompanhamento pedagógico inclui devolutivas técnicas e correções feitas por professores da rede municipal”, explica Jeferson.
Para validação da atividade, os participantes precisam atingir pontuação mínima e demonstrar envolvimento ativo ao longo do processo.
Resultados avaliados e impacto na medida aplicada
Ao final de cada ciclo, um relatório técnico-pedagógico é encaminhado ao Juízo da Infância e Juventude, podendo resultar na redução de até 20% da medida de Liberdade Assistida (LA) ou da Prestação de Serviços à Comunidade (PSC), conforme o engajamento e a evolução do adolescente.
O projeto mantém registros individuais e promove avaliações coletivas, assegurando acompanhamento contínuo, humanizado e transparente.
Gestão compartilhada e inspiração no incentivo à leitura
O controle e a avaliação do “Virando a Página” são compartilhados entre o Poder Judiciário, o Ministério Público e o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, conforme estabelece o Plano Municipal de Atendimento Socioeducativo 2025–2035.
A iniciativa também se inspira no documentário “Palavra Presa”, que retrata a trajetória do desembargador João Marcos Buch, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC). A produção destaca sua atuação como juiz de execução penal e o uso da leitura como ferramenta de transformação em contextos de privação de liberdade.















