A construção de políticas públicas para a promoção dos direitos femininos e para o enfrentamento efetivo à violência doméstica centrou a agenda do Seminário Internacional de Observatórios da Violência contra a Mulher, promovido nesta quarta e quinta feira, pela Assembleia Legislativa de Santa Catarina. O evento foi promovido pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público e do Núcleo de Inclusão e Políticas Públicas da Escola do Legislativo.
Com base em dados oficiais, o seminário revelou que mais de 79 mil ocorrências de crimes contra mulheres foram registradas em 2024 no estado. Só naquele ano, 57 mulheres perderam a vida vítimas da violência doméstica.
Em âmbito nacional, os números são ainda mais assustadores. De acordo com o Painel de Violência contra a Mulher do CNJ, a Justiça brasileira julgou 10.991 processos de feminicídio em 2024, o que representa um aumento de 225% em relação a 2020. No mesmo ano, foram registrados 8.464 novos casos, mas o número de processos julgados superou o de novas denúncias.
O Estado também contabilizou, segundo o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, aproximadamente 40 mil ocorrências de crimes contra mulheres, sendo 175 de feminicídio e 21 crimes julgados.
“MULHERES NÃO ESTÃO NO ESPAÇO DE DECISÃO”
Na abertura do evento, a deputada estadual e Procuradora da Mulher da Alesc, Luciane Carminatti (PT), foi direta: as mulheres estão fora dos espaços de poder.
“Apenas 19 mulheres passaram pela Alesc até hoje, das quais apenas 12 foram titulares. Atualmente somos três mulheres e 37 homens no Parlamento. Isso mostra o quanto ainda precisamos avançar”, criticou.
Ela apresenta dados para atestar essa afirmação. “Passaram pelo Parlamento catarinense 800 deputados até hoje. Deste contingente, apenas 19 são mulheres. Sendo que das 19, apenas 12 são titulares. Ou seja, as mulheres não estão no espaço de decisão. Isso é fato. É inegável”, disse a parlamentar.
Para ela, é necessária uma mudança cultural. “Neste momento atual do Parlamento somos três mulheres e 37 homens. Mas não basta ser mulher. É preciso definir que tipo de representatividade feminina o Poder Legislativo almeja: mulheres que agregam e somam, ou que dividem. Pois cada debate é uma verdadeira tortura emocional”, desabou. Para ela, um dos desafios dos legislativos para mulheres, do ponto de vista emocional, é enfrentar o conflito. “Muitas descartam se candidatar em função desse conflito emocional.”
VIOLÊNCIA ESTRUTURAL E CULTURAL
A professora Joana Célia dos Passos, vice-reitora da UFSC, reforçou que o enfrentamento à violência precisa partir de uma mudança cultural.
“O machismo estrutural está na base dessa violência. Por isso os dados importam: precisamos usá-los para confrontar essa cultura e construir políticas públicas eficazes.”
Ela ainda defendeu o papel dos Observatórios da Violência como instâncias fundamentais para gerar dados confiáveis e conectar instituições do sistema de justiça, assistência social e saúde.
MUDANÇAS COM POLÍTICAS PÚBLICAS
O painel da manhã desta quinta-feira debateu como os dados sobre violência contra a mulher orientam decisões públicas e políticas de segurança. Especialistas defenderam que não há como combater o problema sem visibilidade estatística e que a produção de informação precisa ser contínua e integrada.
Participaram do debate a procuradora-geral de Justiça do Ministério Público de SC, Vanessa Cavallazzi, a delegada e coordenadora das Delegacias de Proteção à Criança, ao Adolescente, à Mulher e ao Idoso de Santa Catarina, Patrícia Zimmermann, a perita-geral da Polícia Científica de Santa Catarina, Andressa Boer Fronza, o tenente-coronel da PM, Frederick Rambusch – Polícia Militar de Santa Catarina, e Teresa Kleba Lisboa – Integrante do Instituto de Estudos de Gênero (IEG/UFSC). A mediadora foi a deputada Luciane Carminatti.
Ainda na manhã desta quinta feira, foi realizado o painel “Observatório da Mulher na Política, Observatório Brasil da Igualdade de Gênero e Observatório da Violência contra a Mulher de Santa Catarina: trajetória, desafios e perspectivas”, com a coordenadora-geral do Observatório Brasil da Igualdade de Gênero, Camila Rocha Firmino, a coordenadora de Pesquisas do Observatório da Mulher na Política, Ana Cláudia Oliveira, e a coordenadora do Comitê Gestor do Observatório da Violência contra a Mulher de Santa Catarina, Anne Teive Auras.
Durante dois dias, um público de 200 pessoas, reunindo autoridades, especialistas, representantes de observatórios nacionais e internacionais, lideranças acadêmicas e políticas comprometidas com a causa, participaram do evento no Parlamento.